O cérebro das máquinas: como a engenharia de automação e os robôs estão redesenhando a nova indústria brasileira

A indústria brasileira está em plena transformação. O cenário impulsionado pela chamada Indústria 4.0 (a quarta revolução industrial) traz consigo linhas de montagem cada vez mais inteligentes, robôs colaborativos, inteligência artificial (IA), Internet das Coisas (IoT), computação em nuvem e sistemas de controle avançados. A mudança não é apenas tecnológica: ela atinge estruturas produtivas, estratégicas e humanas, redesenhando a maneira como se produz, gerencia e inova no país.

No epicentro dessa revolução está a engenharia de controle e automação, área responsável por projetar e gerenciar os sistemas que permitem às máquinas “pensarem” e tomarem decisões, tornando-se o novo motor da competitividade. Seja ajustando parâmetros de produção em tempo real ou garantindo que robôs cooperem entre si sem intervenção humana, essa engenharia é a espinha dorsal da nova indústria brasileira, e mundial.

Da fábrica ao centro de decisões

Com a adoção crescente de sensores inteligentes e algoritmos que aprendem com dados, empresas estão conseguindo prever falhas antes que elas aconteçam, reduzir desperdícios e operar com muito mais eficiência. Esse cenário contribui com o crescimento da automação em todo o planeta. Um estudo realizado pela International Market Analysis Research and Consulting (Imarc), chamado “Monitor da Indústria 4.0″, mostrou que o mercado global do setor atingiu US$ 139,8 bilhões em 2023 e aponta que até 2032 este mercado atinja US$ 547,1 bilhões. O mesmo estudo, analisado pelo Observatório Nacional da Indústria, com publicação no Portal da Indústria, mostra que o Brasil foi responsável por gerar US$ 1,77 bilhão em 2022, e projeta que o valor pode chegar a US$ 5,62 bilhões até 2028, alcançando um crescimento anual de 21%.

Setores como automotivo, farmacêutico, alimentício e de bens de consumo lideram esse movimento, implementando robôs colaborativos, esteiras autônomas e sistemas de controle baseados em IA.

“A engenharia de controle é uma peça fundamental na transição das indústrias para a era digital. Sem ela, não há como garantir que os sistemas operem de forma integrada, segura e eficiente. E o engenheiro de controle é um elo entre o mundo físico das máquinas e o mundo virtual dos dados. A Indústria 4.0 só se concretiza com a base sólida que a engenharia de controle proporciona.”, explica Giulia Ferraz Bastos, engenheira de Controle e Automação com mais de 11 anos de experiência no Brasil e no Canadá.

Os profissionais dessa área trabalham, por exemplo, para permitir que um sistema identifique desvios na produção e corrija automaticamente os parâmetros de operação, sem intervenção humana. “É o caso da indústria farmacêutica, onde sistemas de visão computacional aliados a esteiras inteligentes já permitem inspeções automatizadas com mais de 98% de acurácia, como ocorre em unidades no interior de São Paulo”, cita Giulia.

A realidade das pequenas e médias indústrias

Embora o movimento da Indústria 4.0 tenha começado pelas grandes corporações, ele vem ganhando força também entre pequenas e médias empresas (PMEs). Para muitas delas, o caminho tem sido investir em soluções modulares e escaláveis, como sensores baratos, softwares de controle acessíveis e treinamento de equipes. Programas de apoio tecnológico oferecidos por instituições como o SENAI e a ABII (Associação Brasileira de Internet Industrial) têm sido fundamentais nesse processo.

Essas empresas descobrem que não é necessário automatizar tudo de uma vez: mesmo mudanças pontuais como digitalizar o controle de temperatura de uma caldeira ou automatizar uma linha de embalagem, por exemplo, já podem gerar ganhos de eficiência e reduzir custos operacionais. “Outro exemplo recorrente é o uso de controladores lógicos programáveis (PLCs) compactos para substituir paineis eletromecânicos antigos, o que reduz falhas e melhora o tempo de resposta”, diz Giulia.

“Sem dúvida, a automação deixou de ser exclusividade das grandes indústrias. Hoje, existem soluções acessíveis, como sensores inteligentes, sistemas SCADA simplificados e robôs colaborativos, que são ideais para pequenas e médias empresas. Aqui no Canadá, vejo muitas PMEs adotando tecnologias modulares e plataformas de baixo custo para automatizar tarefas repetitivas. Esse movimento deve acontecer também no Brasil, especialmente se houver incentivo e apoio técnico”, reforça Giulia Bastos.

O impacto no emprego e na formação profissional

A automação, como em todas as revoluções industriais, traz desafios para a força de trabalho. Alguns postos de trabalho manuais estão sendo substituídos por sistemas automáticos. No entanto, novas oportunidades também estão surgindo: profissionais que dominam a lógica da automação, análise de dados e sistemas integrados estão em alta.

Segundo o Mapa do Trabalho Industrial, feito pelo Observatório Nacional da Indústria, a estimativa é que as vagas nas áreas de automação e mecatrônica apresentem um crescimento de 46% no período de 2022 a 2025. Essa transformação exige uma reformulação urgente nas universidades, cursos técnicos e centros de formação profissional.

Para a engenheira Giulia, a base técnica continua fundamental, mas ela precisa ser complementada com habilidades em programação, redes industriais, análise de dados e até segurança da informação. “Conhecimentos em linguagens como Python, por exemplo, estão se tornando cada vez mais comuns entre engenheiros de automação. Além disso, certificações voltadas à gestão de projetos e experiência prática em integração de sistemas fazem grande diferença. O mercado busca engenheiros que compreendam a fábrica como um organismo interconectado e que saibam pensar soluções de forma estratégica”, destaca.

Perspectivas para o futuro

À medida que o Brasil avança nessa nova fronteira industrial, o investimento em inovação, capacitação e infraestrutura digital será determinante para garantir competitividade global. A Indústria 4.0 promete não apenas tornar as fábricas mais eficientes, mas também mais sustentáveis, conectadas e resilientes.

Se antes o diferencial era ter uma fábrica automatizada, agora é ter uma fábrica autônoma e inteligente, capaz de se adaptar a novas demandas, personalizar a produção em tempo real e operar de forma colaborativa com humanos.

“A Indústria 4.0 exige abertura para o novo, investimento em pessoas e coragem para testar caminhos diferentes. Como engenheira de automação, acredito que nosso papel vai muito além da técnica: somos agentes de transformação. Trabalhar com tecnologia é trabalhar com o futuro, e esse futuro precisa ser acessível, sustentável e inclusivo. Se conseguirmos unir conhecimento técnico com sensibilidade humana, a automação será uma aliada poderosa para construir uma indústria mais forte, mais ágil e mais conectada com as necessidades da sociedade.” resume Giulia Bastos.

Ainda há desafios consideráveis como a citada necessidade de maior conectividade em áreas industriais, financiamento acessível para inovação e políticas públicas mais direcionadas, mas o caminho está traçado. E a engenharia de controle é quem conduz o volante desta revolução silenciosa que está moldando o novo Brasil industrial.

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